Com o passar do tempo, a inclusão e a diversidade vêm ganhando cada vez mais a devida atenção. Há uma preocupação gradualmente maior em debater maneiras de integrar e garantir direitos a diversos grupos de pessoas, com todas suas particularidades.
Dentro desse movimento, o design inclusivo tem uma grande função: é preciso entender como se pode melhorar a experiência do usuário para todos, abrangendo aqueles que fazem parte de grupos vulneráveis.
O que é design inclusivo?
Como entrega o nome, o design inclusivo é sobre inclusão. O objetivo é colocar as pessoas em primeiro lugar, como centro da criação. É de extrema importância fazer com que qualquer usuário consiga ter uma experiência agradável e fluida, sem maiores dificuldades.
É mais comum nós associarmos o termo “inclusão” com acessibilidade, pensando em algum tipo de deficiência física. No entanto, o design inclusivo vai além: são levados em consideração aspectos como etnia, idade, orientação sexual, identidade de gênero, cultura etc. — todos os grupos que passam por um processo de exclusão por parte da sociedade.
Os profissionais envolvidos na criação de um serviço ou produto, seja ele qual for, têm o dever de estudar os obstáculos que os usuários podem experimentar e procurar formas de eliminá-los.
Para a gente poder entender melhor como isso funciona, vamos analisar os princípios do design inclusivo:
1. Conhecer o público-alvo e seus desafios
Parece óbvio, mas não tem como criar alternativas e soluções para o design inclusivo sem conhecer o público-alvo e os pontos que requerem adaptações. Quando você se coloca no lugar do outro, reconhecendo seus privilégios, é muito mais fácil entender o que ele precisa para poder desfrutar de uma experiência com qualidade, usabilidade e acessibilidade.
Por isso, é indispensável um exercício de empatia: avalie as situações sob a perspectiva do seu público-alvo, levando em conta os desafios que esse grupo tem que enfrentar na execução daquela tarefa. Como você pode tornar uma imagem “visível” para pessoas que não enxergam? Colocando descrições com detalhes. E como uma pessoa que não compreende o idioma utilizado no texto ou no áudio pode entender a mensagem? Com tradução.
Existem muitos cenários e contextos possíveis, e é por essa razão que o estudo deles é bem intenso, mas extremamente essencial! O propósito principal é fazer com que as pessoas que sofrem frequentemente com a exclusão sejam compreendidas encontrando soluções eficazes para incluí-las.
2. Oferecer uma experiência equivalente
Diante da percepção das características de cada usuário e suas possíveis necessidades, é imprescindível pensar em como criar uma experiência similar para todos. As pessoas são diversas e únicas de várias maneiras e não seria justo que um grupo não pudesse ter a mesma qualidade e eficiência na execução de tarefas diárias ou no uso de um produto, né?
3. Criar um padrão
A experiência do usuário é otimizada quando padrões são repetidos. A compreensão dos comandos, funções e opções é alcançada mais facilmente quando há consistência e uniformização no projeto. Isso garante eficiência e maior usabilidade, dando autonomia aos usuários, ou seja, eles conseguem entender como o produto funciona e podem usá-lo com facilidade.
A padronização pode ser feita com o uso de convenções já estabelecidas, como, por exemplo, a utilização de símbolos comumente conhecidos — um X para representar que a página será fechada e setas para voltar ou avançar.
4. Optar pela simplicidade
Além de padronizado, é interessante elaborar algo simples e intuitivo. Do contrário, o usuário pode apresentar problemas ao interagir com a interface. Lembre-se de que a ideia é possibilitar que pessoas de diferentes origens, culturas, gêneros, etnias consumam aquele conteúdo, da maneira mais universal possível.
5. Disponibilizar opções
Outra forma de viabilizar a autonomia dos usuários é permitir que eles possam escolher como customizar a interface de acordo com suas preferências e as circunstâncias do momento. Disponibilizar opções de configurações como tamanho da fonte, zoom, contraste, idioma, sons, dentre as mais variadas possibilidades, é fundamental para que os usuários sintam que têm controle sobre a experiência, podendo adaptá-la como desejarem.
A gente vê exemplos disso em alguns sites, aplicativos e produtos. Criar opções para alterar detalhes pode fazer a diferença na funcionalidade e usabilidade para os usuários. Nada melhor que deixar tudo do jeito que te agrada e que mais vai ser útil!
6. Focar no conteúdo
É mais um modo de facilitar o uso de uma interface. Quando você deixa claro qual é o conteúdo principal, torna menos complicado o entendimento dos recursos e funções disponíveis.
Não dá para focar em várias coisas ao mesmo tempo, então o ideal é colocar em evidência o assunto tratado naquele momento e ir liberando as informações conforme for pertinente. Assim, você não vai deixar o usuário confuso com um turbilhão de ideias de uma vez só.
7. Estender a solução para todos
Imagine que uma pessoa com deficiência auditiva resolve assistir a um vídeo. Se não houver legendas, ela não vai ter acesso àquele conteúdo. Entretanto, se as legendas estiverem disponíveis, ela poderá ver e entender o vídeo. Mas não é só ela quem será beneficiada — alguém num lugar barulhento sem poder ouvir sons naquele momento também poderá assistir ao vídeo.
Assim, a gente pode perceber que uma solução pensada para um determinado grupo pode favorecer outro, melhorando a experiência para todos os envolvidos!
Como colocar na prática?
É importante avaliar o que é necessário para fazer o design inclusivo acontecer. Se você contar com a equipe certa e envolver o usuário no processo criativo, vai ficar muito mais fácil alcançar resultados.
Um time cheio de diversidade entre os profissionais (com diferentes culturas, classes sociais, idades, etnias, gêneros, capacidades etc.) é um dos principais passos para garantir que você terá pessoas que realmente entendem as dificuldades e desafios vividos pelos usuários.
Além disso, o próprio usuário é quem deve informar suas necessidades e especificidades. Como já dissemos, os usuários são o centro da atenção no design inclusivo, então é indispensável ouvi-los: faça entrevistas com eles, teste ideias, peça opinião sobre o resultado final. Crie um processo em que eles sintam que de fato estão participando e estão sendo respeitados.
Agora vem ver com a gente alguns exemplos de aplicação do design inclusivo:
Legendas
As legendas têm o intuito de transcrever o que está sendo dito, e também de traduzir o conteúdo, aumentando o alcance do material em formato de vídeo.
O YouTube é um exemplo de plataforma que permite que os proprietários dos vídeos coloquem legendas. Elas podem estar no idioma falado ou em outros idiomas. Há também a transcrição automática, habilitada em alguns vídeos. Para conseguir ativar a legenda e escolher o idioma, é só seguir o gif.
Formulários
Antes de mais nada, é sempre interessante primeiramente se perguntar o porquê de estar coletando determinado dado. Por que seu usuário precisa te contar isso? Alguns dados são superpessoais, então só devem ser abordados quando necessários. Se você chegar à conclusão de que se trata de uma informação importante, o próximo passo é descobrir como fazer a pergunta e, depois, dar uma gama de opções possíveis para a resposta.
O Tinder mostrou-se preocupado com a inclusão ao criar mais alternativas no campo de identidade de gênero e no de orientação sexual. No primeiro, você pode fazer uma busca para encontrar sua identidade. No segundo, eles te dão algumas opções e possibilitam que você escolha três delas.
Linguagem neutra
Na língua portuguesa, a regra é usar termos masculinos para se referir coletivamente a pessoas de gêneros distintos, o que passou a não ser visto como o ideal. Ainda, algumas pessoas não se identificam com um gênero específico. Pensando nisso, criou-se uma linguagem neutra.
O Clue é um aplicativo que monitora a menstruação. Em seus textos, levando em conta a inclusão de indivíduos de todos os gêneros que menstruam, é usado “@” no lugar de “a” ou “o”. Mas é legal a gente se atentar para uma crítica a essa escolha: muitos softwares de leitura não conseguem ler palavras com esse símbolo, e isso prejudica quem depende desses softwares para entender o que está escrito. Por isso, começou a ser adotada a letra “e” para substituir “a” e “o”. Alguns usam a letra “x” também.
Representatividade nas imagens e nas ilustrações
Os usuários procuram se reconhecer quando veem imagens e ilustrações. A representatividade tem um papel fundamental de fazer as pessoas se sentirem acolhidas e valorizadas. Estampar rostos e corpos padrões impede a conexão entre a marca e o consumidor. Existe tanta diversidade entre os seres humanos que não há razão para representar um só grupo.
O Clue também traz ilustrações com diversidade, retratando pessoas de etnias e estruturas corporais distintas. Nos jogos, a representatividade pode aparecer na possibilidade de customização dos personagens, como em The Sims, com diferentes traços e tipos disponíveis. Outro exemplo dentro do mundo dos games é a construção de uma narrativa com personagens diversos, como em The Last of Us Part II, em que há um casal lésbico.
Acessibilidade
Você já sabe que o design inclusivo não se resume à acessibilidade, mas ela também é parte essencial da ideia. Encontrar meios para adequar a experiência para pessoas com qualquer tipo de deficiência é um objetivo claro e inegável da inclusão.
Um aplicativo bem famoso para aqueles com deficiência visual é o Be My Eyes (Seja Meus Olhos). Ele atua como uma rede de apoio a fim de que pessoas que conseguem enxergar possam ajudar quem não tem essa capacidade. São feitas videochamadas para que usuários auxiliem com tarefas diárias, leitura de textos e descrição de imagens. É uma maneira de conectar e aproximar indivíduos — a interação entre pessoas com diferentes vivências só pode agregar, porque permite que elas possam entender melhor as dificuldades que cada um tem que enfrentar. É nada mais que praticar a empatia!
O Evolve21 é um aplicativo que promove uma rotina de exercícios aeróbicos, de ioga e de meditação para pessoas com deficiências físicas, que acabam sendo excluídas da maioria das plataformas desse nicho. As atividades são pensadas para diferentes tipos de deficiência por instrutores que também lidam com alguma deficiência física e podem ser customizadas de acordo com as habilidades do usuário.
Depois de analisar todos esses exemplos (e existem muitos outros, mas ainda não o suficiente), dá para perceber o quão impactante é o design inclusivo. Ele expande o alcance do produto e cumpre a responsabilidade social. Mas não é só isso, a perspectiva vai além do interesse comercial. É sobre ter uma influência significativa na vida dos usuários, em como eles se relacionam e o que eles valorizam. Ter um olhar voltado às necessidades alheias e incentivar conversas sobre o tema contribui para uma sociedade mais justa e consciente.